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Mostrando postagens de agosto, 2011

Antes de nascer o mundo

Quando sofremos frustrações, reinventamos nossa forma de viver, evitando que as tais decepções voltem a ocorrer. Isso é normalmente lógico. Um povo tenta sempre esquecer suas tragédias reeditando sua história. Assim vive o povo moçambicano, tentando esquecer a guerra civil que devastou o país. Aliás, vive como se esse episódio lamentável nunca houvesse acontecido. Quem corrobora essa ideia é Mia Couto, autor moçambicano de repercussão literária mundial. Os vestibulandos, em sua maioria, prefeririam que esse texto fosse sobre “O último voo do flamingo”, também de Couto, pois esse livro consta da lista de leitura de diversos vestibulares. Mas o texto aqui não terá o condão de fazer especialista na literatura moçambicana. É, mais uma vez, uma forma de levar o leitor assíduo ao blog à tentação de ler o livro recomendado. E espera-se que o leitor não resista a esta suculenta maçã. Aprecie sua beleza, se delicie na doçura, conheça o imponderável. “Antes de nascer o mundo” é um livro

Era um dia diferente quando não se tinha notícias

No meu tempo de repórter, rum, me extasia ter que lembrar, a redação enlouquecia, quando o mundo não nos abastecia com notícias. Sei que há quem diga, mesmo os que são do ramo, que isso é uma lenda, que notícias se tem todos os dias, porque o mundo não pára de girar e porque os acontecimentos nos são elementos de grandeza irascível, faz parte da vida, a ciência é capaz de explicar e tudo o mais. Digo que não, que é possível inexistirem fatos noticiosos num intervalo de 24 horas, sim, porque a notícia, eu tenho certeza, é uma entidade, um organismo quase vivo que dispõe de vontades próprias e que pode e sabe muito bem fazer uma merecida de uma greve. Quando começo a relatar essa abstinência jornalística para quem muito raramente em minha residência me visita, geralmente o visitante arruma uma desculpa, não faz muitas cerimônias, me toma como mentiroso, me agradece pelo cafezinho e vai embora, desprezando a cordialidade de dona Miríades, minha desde todo o sempre empregada do

Sobre nossa existência

“Nasci para satisfazer a grande necessidade que eu tinha de mim mesmo.” “O homem não é nada mais do que aquilo que faz a si próprio.” JEAN-PAUL SARTRE Após acordar, temos a exata sensação que ainda estamos vivos, mesmo que raramente reflitamos sobre este fato. E nem sempre também nos perguntamos por que razão mesmo estamos vivos. Quem sou eu? De onde vim? O que estou fazendo aqui? O que representa a vida para mim? Para onde vou? Perguntas difíceis. Para muitos, apenas perguntas retóricas. Muitos fogem dessas indagações por toda a vida e, diriam alguns, vivem utopicamente. Levariam eles uma vida sem sentido? Buscar sentido para as coisas é algo inato do ser humano. Mas não ter resposta é algo que odiamos. E talvez essa seja a causa do distanciamento de grande parte da população a estes questionamentos. É possível ponderar também que na nossa sociedade contemporânea, cuja alcunha de sociedade fast-food cairia como uma luva, os indivíduos querem respostas prontas. Se a ciência não as

OLHAI OS LÍRIOS DO CAMPO – leitura obrigatória

“Se naquele instante – refletiu Eugênio – caísse na Terra um habitante de Marte, havia de ficar embasbacado ao verificar que num dia tão maravilhosamente belo e macio, de sol tão dourado, os homens em sua maioria estavam metidos em escritórios, oficinas, fábricas… E se perguntasse a qualquer um deles: “Homem, por que trabalhar com tanta fúria durante todas as horas do sol?” – ouviria esta resposta singular: “Pra ganhar a vida”. E no entanto a vida ali estava a se oferecer toda, numa gratuidade maravilhosa. Os homens viviam tão ofuscados por desejos ambiciosos que nem sequer davam por ela. Nem com todas as conquistas da inteligência tinham descoberto um meio de trabalhar menos e viver mais. Agitavam-se na terra e não se conheciam uns aos outros, não se amavam como deviam. A competição os transformava em inimigos. E, havia muitos séculos, tinham crucificado um profeta que se esforçara para lhes mostrar que eles eram irmãos, apenas e sempre irmãos. Na memória de Eugênio soaram as palavr