“[...]Também pôs no coração
do homem o anseio pela eternidade[...] Melhor
é ir à casa onde há luto do que ir à casa onde há banquete, porque naquela se
vê o fim de todos os homens, e os vivos o aplicam ao seu coração.”
Sábio Salomão
Todo mundo já ouviu que a
coisa mais certa na vida é a morte. Desse modo, saber que em algum momento ela
vai ocorrer para todos é algo tão previsível que deveríamos estar preparados
para esse momento. Na prática, não é o que acontece, principalmente no nosso
mundo ocidental. Eu cresci evitando velórios e funerais, como a maioria das
pessoas que conheço. E não tive tantas oportunidades assim (ainda bem), visto
que minha família tem se demonstrado longeva: tenho avós e avôs paternos e
maternos vivos. Minha mãe sempre me dizia que ninguém vai a velório por que gosta
(devem haver exceções, obviamente), mas em consideração a quem se foi ou ao
menos a quem ficou enlutado por essa perda. O luto é um sentimento de tristeza
profunda, que apenas quem sofreu sabe o que é. O luto costuma variar de pessoa
para pessoa, visto que há quem supere com mais facilidade, há quem nunca supere
e há quem passe do luto à depressão num caminho sem volta. Essa variedade
depende do que hoje chamam de inteligência emocional, conceito inventado por
Daniel Goleman, e das circunstâncias que envolvem o luto. Fato incontestável é
que a grande maioria de nós ocidentais não está preparada para este evento. Você
está? Eu não estou preparado para perda de meus avós, que já ultrapassaram a
oitava década de vida, que dirá de pais, tios, primos, irmãos, esposa ou
filhos. De certo modo cronológico, aceitar a perda do mais velho é relativamente
mais fácil, mas não significa que isso torne esse luto menos doloroso, já que
quanto mais tempo de vida, mais tempo de relação/afeição teremos. Por outro
lado, aceitar as mortes trágicas (tão comuns em nosso país, infelizmente), principalmente
de jovens e crianças, é algo extremamente difícil, que costuma ser um processo
demorado e que gera muitas externalidades negativas (depressão, crises). Estou
escrevendo essa reflexão como um leigo no assunto, do ponto de vista
psicológico e filosófico. A minha visão é de um humano, que não sabe o que vai
acontecer, não sabe como reagir, não sabe como ajudar e acha necessário refletir
sobre um assunto totalmente escanteado em nossa cultura. A forma de vivenciar o
luto varia muito entre as culturas e as religiões do mundo. Da mesma maneira, a
preparação para a própria morte varia. Não queremos nem cogitar isso, porque dá
mau agouro, alguns mais místicos vão dizer, ou porque isso é perda de tempo,
diriam os mais adeptos do carpe diem. Marie de Hennezel, psicóloga experiente
em cuidados paliativos, e Jean-Yves Leloup, teólogo e psicólogo, fazem uma excelente
reflexão sobre a “A arte de morrer”, baseada principalmente nas tradições
religiosas e na espiritualidade humanista. Para eles, o mundo que nos rodeia
não nos ensina a morrer e tudo é feito para esconder a morte. Alguém duvida? Mesmo
nos meios religiosos, onde se costuma crer em uma vida pós-morte, há uma enorme
dificuldade em se preparar para a morte. O cristão sabe que morrer é lucro, nos
dizeres do apóstolo Paulo, mas nunca quer aceitar esse lucro. A maioria das
pessoas crê num lugar melhor após a morte, mas prefere ficar aqui, no mundo
tenebroso. Talvez toda essa dificuldade de aceitar a morte esteja ligada ao
fato de que acreditemos que nascemos para sermos eternos, embora tenhamos a
certeza da impossibilidade disso. Eu ainda não aceito a morte, ainda não estou preparado
para o luto, ainda não estou preparado para o término da minha vida. Mas
reconheço que preciso fazer tais coisas, pois a inevitável e inexorável morte
pode tardar, mas ela não falha.
Comentários
Belo texto, Tiago.
Abraço!