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Despretensiosidade não existe, mas rima com saudade

                Não quero ser lido; quero e preciso apenas escrever. Escrevo como quem se contorce enquanto chupa um limão para sarar uma gripe. É que começar a escrever um texto despretensioso é trabalhoso, é complicado. Escolher palavras – porque, nessa vida, tudo se vai, menos a vaidade e a mania de grandeza - é talvez a mais espinhosa tarefa, quando se pretende voltar a escrever. É quase como tentar resolver uma equação do segundo grau após ter deixado para trás, num caderno esquecido à poeira, os longos anos rabiscando, para não esquecer, que delta é igual a B ao quadrado menos, menos o quê, mesmo? Esqueci.
 
E as ideias, muito mais do que um conjuntinho de boas palavras, na verdade, somem mais do que qualquer outra noção linguística, de modo que foram 16 as noites pensando no que escrever. A escrita, para se exibir a terceiros em sua inteireza e sem imperfeições, cobra algo que nenhum preguiçoso metido a escritor pode lhe ceder, que é uma palavrona chamada periodicidade. É a falta do exercício que faz com que a escrita assim se revele, desinteressada e desinteressante, como quem impõe uma espécie de cobrança pelos dias, pelas semanas ou pelos meses, sendo este último o meu caso, sem nada redigir.
É talvez por traí-la e por negligenciá-la por durante tanto tempo que escritores amadores em todo o mundo tenham ainda que padecer por chegarem ao terceiro parágrafo sem nada acrescentar ao leitor, a não ser a nele instalação do ódio e da promessa de nunca mais à página empunhada ou à página virtualmente carregada retornar. É o preço que se paga.

E assim se chega ao quarto parágrafo, que é, conforme aprendi, o lugar onde toda redação que se preze deve parar. É, diziam os professores do meu antigamente, onde deve ser encontrada a conclusão. Não é esse aqui o caso. Aqui haverá apenas um relato despretensioso, em três linhas, de que Budapeste, de autoria de Chico Buarque e publicado pela Companhia das Letras em 2003, é um grande achado dos últimos assopros da nossa tão abastada literatura nacional. Mas não é, na verdade e despretensiosamente falando, porque acabo de ler Budapeste que aqui estou. Despretensioso, escrevi isso aqui, na falta de algo melhor para falar, só pra voltar a dizer olá.

RF

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