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O cheiro azul do mar

Saudade, a palavra, teima em aparecer nos meus projetos mentais de textos, sempre que, como hoje, passo diante do mar. É quando a mistura de sensações torna-se inevitável e eu, tocado pelo vento que carrega consigo ínfimas fragrâncias azuis, me recordo dos melhores verões da minha vida.
Tenho mania de fazer longas arqueologias, de vez em quando. O mar tem para mim uma conotação lúdica e refrescante: os verões da minha infância - e de quase toda a minha adolescência - foram bem aproveitados na praia que fica próxima à minha casa, onde a água azul beijava a bola e nos convidava para um mergulho quase sem volta.
Íamos à praia - eu, meu irmão e alguns primos - em qualquer dia da semana; bastava-nos apenas que o vento colorido desse-nos boas notícias da maré. Os nossos "babas" - partidas amadoras de futebol - sempre terminavam sob o apito final do mar, que cobria grande parte do campo improvisado na areia para tornar-se, em seguida, ouvinte dos nossos sonhos e planos.
O caminho que me leva da Universidade ao trabalho, sob o sol escaldante do meio dia, tem em seu início um cenário deslumbrante: as praias de Ondina e da Barra, bairros tradicionais de Salvador. É encantado por essa visão que interrompo a leitura à janela do ônibus para, tomado pela palavra que iniciou o texto, sentir-me novamente como o banhista de outrora, com aquele cheiro salgado no nariz a sonorizar os cenários e a dar forma ao barulho das idas e vindas do mar.
A praia que mais frequentei na vida ainda existe, mas eu já não sou como o mesmo praieiro de antes. O olhar do menino que brilhava ao ver aquele imenso azul perdeu-se, certamente, entre as obrigações da vida em que tudo é de concreto; nada é sinestésico.

RF

Comentários

Gabriel França disse…
Por perceber que você não tinha feito um texto longo, logo me antecipei à uma possível crítica, mas após ler, gostei muito! Fiz parte dessa história e sei o quanto eram bons esses momentos de mar, vento, céu azul e muita conversa. Os tempos mudaram, é verdade, mas, com certeza, tiramos grandes lições daquela boa época para a nossa vida.
Ficou bom mesmo o texto, velho!
Parabéns.
Anônimo disse…
Eta nostalgia! Deu uma saudade daquelas tardes fagueiras...video-game, baba, conversa fiada, banho de mar...era MARAVILHOSO!Você voltou, hein parceiro. Ainda tímido, mas voltou! Cuidado com o mundo universitário! Não nos abandone! Precisamos de seus textos. Agora sim, vou voltar a postar. Um forte abraço,

Tiago França

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