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SOMOS PERSONAGENS DE UMA HISTÓRIA?


O cinema é realmente um atrativo maravilhoso, que gera fascínio, diversão e também conhecimento. Por essas e outras razões ele se tornou a sétima arte. Mas porque sétima? Quando era ignoto no assunto achava que "sétima" era apenas numerologia mística. Me enganei feio! Com um pouco mais de pesquisa e de sabedoria arraigada ao cérebro, descobri que, antes da invenção do cinema - dezembro de 1895 -, havia seis artes tradicionais. São elas: arquitetura, literatura, pintura, música, dança e escultura. Dada a sua importância e magnitude, o cinema adentrou neste rol artístico e ficou conhecido como "sétima arte". Devido a tantos benefícios, sou um inveterado cinéfilo. Ainda distante de ser um fanático, pois sou apenas um apreciador desta arte. Inopinadamente, descubro grandes filmes, boas hisórias, roteiros interessantes e boas representações em filmes até desconhecidos do grande público. Sempre que posso, trago minha opinião sobre os mesmos aqui no Intitulável.

Stranger than Fiction é o título original desse maravilhoso filme que vi numa aula da faculdade. Mais Estranho Que A Ficção é o título em português. A aula era sobre criatividade e quem realmente ministrou a aula foi o filme. Inicialmente nos deparamos com Harold Crick (Will Ferrell), um funcionário da Receita Federal extremamente rotineiro que passa a ouvir seus pensamentos como se fossem narrados por uma voz feminina. Somente ele ouve essa estranha voz que narra com precisão seus passos, ações, pensamentos e sentimentos. O clímax inicial ocorre quando a voz fala na iminente morte de Harold. A partir daí, este hilário personagem vai tentar descobrir a todo custo de quem é a voz, com o objetivo de evitar a sua morte. No desenrolar da trama, pode-se compreender que Harold, apesar de ser um ser real, é um personagem fictício de um livro. Toda a sua história de vida foi escrita por uma escritora de romances trágicos e que não está conseguindo bolar uma maneira de matá-lo.

O filme é dinâmico e atrativo. Conta com boas apresentações e com um toque de talento de Dustin Hoffman e Emma Thompson. Mas a beleza do filme está na genialidade em retratar o ato de escrever, ou melhor, o ato de criar uma história, de dar vida a um personagem e de definir o seu destino. Imaginarmo-nos como escritores é interessante. Ver-nos como pensonagens é assombroso. Daí decorre a proposta do filme. Em ambos os lados da moeda existem problemas intrínsecos da função. Em "Estórias Inacabadas", texto escrito aqui no Intitulável por Rafael França, podemos ver claramente as vicissitudes do ato de criar. Existe uma enorme crise entre autor e obra, criador e criatura. Lembro de Clarice que para "enganar" a crítica inventou um escritor masculino o Rodrigo S.M., que não lacrimejava piegas. Mas no fim do livro, o falso mentor da história, que na verdade também era um personagem, não pode fazer nada ante a morte iminente de Macabéa, sua querida personagem. Clarice, a verdadeira escritora, teve o poder sobre o destino de Rodrigo e de Macabéa.

Num dos ramos da filosofia, podemos encontrar a ideia encorpada pelo filme de que nós somos teleguiados. Somos personagens de uma grande história. Nosso destino já foi traçado. Nosso passos planejados. E tudo que fazemos foi previamente estabelecido pelo grande escritor, comumente designado por Deus. Seríamos então marionetes da potente mão de Deus? São questões metafísicas que não podem ser solucionadas pela ciência humana. Cada corrente tem seus argumentos. Porém, a verdade não é clara. Não acredito que ela seja multivariada. Apenas não existe um consenso. A beleza está em refletir sobre quem somos, onde estamos e para ode vamos. Filmes como esse são surpreendentemente educativos. Ele não traz resposta. Assim como A Hora da Estrela de Clarice, ele todo é uma pergunta. Aqui fica o convite para assistir esta maravilhosa película e também para que você, querido e paciente leitor, possa compartilhar conosco suas ideias, pensamentos, crenças e filosofias.

Comentários

Gabriela Farias disse…
Tiago, Tiago. Depois desse seu texto, acredto que meus conhecimentos sobre cinema e minha contribuição nesse blog são totalmente dispensáveis. Me demito.

Brincadeiras a parte, cinema é algo que vai muito além das telas. E o filme realmente parece interessante. Não o conheço, mas entrará, com certeza, na minha lista de filmes que assistirei em breve.
Parabéns.

Abraço.
Rafael França disse…
Você me devolveu a mesma ansiedade que fiz você sentir, quando escrevi sobre "Doce Novembro", no ano passado. Já estou desesperado pra ver esse filme. O seu texto embasado e muito bem elaborado me serviu como mais uma fonte de indicação, já que volta e meia, em nossas conversas, você fala sobre a grandiosidade desse enredo. São válidas e pertinentes também as reflexões expostas nos últimos parágrafos. Mas, ciente do fascínio que personagens e textos literários exercem sobre mim, você vai me perdoar - e agradecer - por não entrar em divagações tão profundas acerca do tema. Só em conhecer a proposta do filme, já gostei dele. Espero mesmo poder assistí-lo, em breve. E se prapare. Porque se você ainda não assistiu "Quem quer ser um milionário?" - justamente vencedor do último Oscar -, eu vou me encarregar de escrever um texto sobre este excelente filme, também. Um abraço,

RF
Jaqueline disse…
Tiago mais um excelente texto!
não assistii esse filme mas... ainda essa semana vou procurá-lo.
Deve ser mesmo muito interessante.
Parabéns!!!

E Rafael... vou esperar o seu 'post' do filme "Quem quer ser um milionário". Depois de Orgulho e Preconceito esse é o filme que eu mais amo na terra e tenho CERTEZA de que você o descreverá muitíssimo bem !
Gabriel França disse…
Parece mesmo ser um filme interessante. Já aceitei o convite. Vou assistí-lo assim que puder.

Abraço!
Anônimo disse…
É realmente um filme interessante. Espero que ele não frustre a expectativa de vocês. Obrigado pelos elogios. Quanto a discussão intrínseca ao tema da película, eu me posiciono contrário a ideia de sermos marionetes de Deus. Acredito na existÊncia divina e no Criacionismo. Mas creio também no livre arbítrio, dado também por Deus. Somos culpados por nossas ações e não marionetes. Por isso, temos a nossa vida inteira para viver, conhecer, experimentar, aprender, refletir e enfim decidir. As decisões são sempre nossas.

Um forte abraço,

Tiago França
Gabriel França disse…
Tive a oportunidade de assistir a esse filme espetacular na noite de ontem! Muito interessante! Já está na lista dos meus melhores filmes!

Um abraço!

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