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SILÊNCIO

É quase sempre a mesma coisa. Mas naquele dia acho que ela exagerou. Por um longo tempo me perguntei por quê? O ciúme é geralmente a causa principal, mas conosco acho que nunca foi. E nesta vez com certeza também não foi. Não vou ficar divagando. Vamos aos fatos em sua ordem corrente. Sexta-feira. Um dia propício a desentendimentos. As razões são meio loucas. Final de semana. Estresse. Misto de alegria e angústia. Há a saudade. Mas existem outros fatores intrínsecos a situação. Como em quase toda sexta, a comunicação foi fonada. Acho que esse é outro fator. Uma mudança que me contrariava, realmente me contrariou. Reagi como sempre. Silêncio. Ela também age assim na maioria das vezes. Ela não gostou. Fim da ligação. Estava cansado. Deitado. Suado. Eu havia me chatiado. Ela mudou o horário do trabalho e eu não gostei. Ia atrapalhar eu assistir o jogo do Vitória. Mas não era só isso, não sou apenas egoísmo. Eu pensava nela. Pegaria 11 da manhã. Não almoçaria. Eu me preocupo com ela.

Alguns minutos passaram. Não era possível, brigar de novo não! Me arrependi como sempre. Meu orgulho ão me segurou. Liguei de novo:

- Amor, você se zangou?
- Não.
- Tem certeza?
- Não.
- Vamos sair amanhã?
-Você é quem sabe.
-Eu não. Você tem que me dizer...
-Vou.

Ela continuava a mesma. Eu sabia que ela estava zangada. Mas a minha parte eu já havia feito e fui dormir com um misto de raiva e sentimento de culpa. Dormi bem. Dia novo. O sábado chegou. Dia de fazer o que não faço na semana. Como dormir até mais tarde. Saí. Estava dirigindo. "OLHA A MENSAGEM" - gritou meu celular. Me preocupei. Antes mesmo de ver o conteúdo. Vou transcrevê-la.

"Marcos, ñ vou + sair a noite e ñ venha me buscar."

Quase bati o carro. Uma rápida leitura me fez entender tudo ou entender nada. Meu pai que estava comigo percebeu meu alvoroçamento. Queria chegar em casa. Queria ligar para ela. Demorou. Trânsito. Engarrafamento. Carreatas. Estresse. Cheguei em casa. Fui logo ligar para ela. Uma, duas, dez, vinte, perdi a conta. Ela não me atendi nem me retornava. Isso não era comum. Preocupei-me. Nem com muita raiva ela agiria assim. Passei o dia ligando para ela. Pensava em mil coisas. Ela estava trabalhando, podia não atender. Mas na hora do descanso ela ligaria. Assim esperava. Mas eu não aguentava esperar e tornava a ligar. Mandei mensagens:

"Amor, o q aconteceu? Está zangada comigo? Preciso falar com vc, quando puder me ligue. Te amo muito. Desculpe-me qualquer coisa. Preciso d vc. Bjos"

"Meu amor, kd vc? To aki numa angustia danada. Por favor, atenda o cel. Pq tudo isso? Merecemos tanto? Não me deixe, por favor fale comigo. Bjos com muitas lágrimas."

"Amor, o q fiz d tao grave? Vc nunca agiu assim comigo. Estou triste, preocupado, desesperado. Por favor, me perdoe. Fale comigo, estou implorando."

Eu realmente apelei. Era o desespero. Um angústia terrível me afligia. O dia estava terrível. Ela não queria falar comigo. Não queria mais sair à noite. Não queria que eu fosse buscá-la. Essa era a pior parte. Ela não queria nem me ver. Não coseguia acreditar. Uma dor no peito. Que loucura. Tentava esquecer, tentava me distrais. Tudo me lembrava ela. E tornava a ligar. Conjecturei muitas hipóteses. Ela havia se sentido trocada pelo futebol. Era uma possível explicação. Se zangou porque eu me zanguei, por que a sua mudança de horário não me permitiria ver o jogo. Que loucura. Mas era isso mesmo. Eu achava. Mas não aceitava, afinal ela me conhecia. Nunca a troquei por futebol ou seja lá o que for. Ela é o meu tudo, o meu mundo, o meu pensamento intermitente.

A agonia amenizou enfim. Ela ligou. Ou será que piorou? Eu já estava decidido a ir buscá-la. Estava de volta da babearia. Resolvi ligar de novo. Dessa vez ela retornou. Eram mais de 16 horas. Foi fria. Indiferente. Como uma agulha traspassando as minhas costas. Indaguei sobre a mensagem. Ela respondeu tudo secamente. Não ia mais sair. Não era pra eu ir buscá-la. Não havia acontecido nada. Ah... que droga! O mundo desabava sobre minha cabeça. A indiferença daquela que tanto amo me deixava triste, desarmado. Chorei mais uma vez. Não era a primeira vez neste dia. E pelo visto não seria a última. Lutei contra o meu eu. Contra o meu orgulho. Contra a miha solidão. Banhei-me. Lavei-me das impurezas. Purifiquei minha alma. Estava abatido. Estava atribulado e angustiado. Estava perplexo, desanimado. Abatido, detruído por dentro. Beirava o desespero. Eu precisa contrariar àquela mensagem. Foi o que fiz.

Me arrumei. Saí mais cedo. Escrevi uma cartinha de reconciliação, se é que isso existe. Passei no shopping. Comprei um buquê de rosas. Sim. Flores. Tão belas, tão amenas, tão propícias. Talvez elas atenuassem o coração de minha amada. Afinal, eu já estava contrariando o seu desejo indo buscá-la. Comprei cartões. Escrever sempre foi o meu forte, apesar de que com ela sempre demorou de fazer efeito. Ela é forte, resistente. Mas eu sou persistente. Fui vê-la. Cheguei em seu trabalho no horário que o jogo começaria. Nem me lembrava mais dele. O vitória que se danasse, como de fato ocorreu. Eu precisava reconquistar meu amor. O reencontro não foi nada parecido com um gran finale. Era a dura vida real. Minha namorada era forte demais para mim. Ela sorria com as colegas. Conversava livremente com os colegas. Eu me enciumava. A atenção a mim foi mínima. Ela ainda estava de serviço. Eu suportava. Dava voltas. Choramingava internamente. Tudo para ela era tão normal. Ela não se importava comigo. Era o que eu sentia no meu peito. Mas não acreditava nisso. Comprei bombons. Arrumei tudo no carro. Flores, bombons, cartinhas.

Não surtiu efeito. Ela recebeu os presentes com surpresa. Pedi a ela para ler tudo. Ela começou a ler. Repeti minhas indagações. Não obtive resposta. Tudo para ela era NADA. Isso me machucava. Eu dirigia com lágrimas nos olhos. Chegamos em sua casa. O clima continuava instável. Eu ainda estava sufocado. Ela continuou a não responder meus questionamentos. Eu desabei em lágrimas em sua frente. Quem disse que homem não chora. Eu estava lacrimejando piegas, CLARICE. Eu era o fraco, ela a forte. Meu choro não a comovia. Infelizmente. Num estalo de remorso, acho eu, ela resolveu abrir de fininho a porta do coração. Ela estava com muita raiva de mim, devido ao meu silêncio ontem, que segundo ela não era a primeira vez. Eu não podia retrucar. Mas não conseguia imaginar que tudo aquilo fosse uma punição pelo meu silêncio no dia anterior. Eu achava demais. Eu continuava a chorar. Ela se incomodou. Resolvi ir embora. Senti um pouco da alma dela nesse instante. Ela me mandou sentar, não me deixou sair. Ela disse que eu não precisava chorar porque ela já tinha falado tudo. Eu não queria mais ficar ali chorando na frente dela. Lutei contra a tristeza e dessa vez tive o apoio dela. As pazes foram sendo seladas no diálogo, na conversa, na zuada, não no silêncio. Ela tinha fome. Eu não lembrava o que era isso. Mas quando a dor do meu peito diminui, também senti fome. Resolvemos ir à pizzaria. Findamos a noite unidos, conversando, explicando, tentando esquecer aquele fatídico dia. A rotina voltava. E amanhã era um novo dia. Basta realmente a cada dia o seu mal. Tomara que amanhã não seja dia de silêncio.

Comentários

Quéren disse…
Achava que era no silêncio que se obtinha respostas... me enganei...só no de Deus...
Essa história é conhecida, ou será impressão?
Marcos é um apaixonado maluco.
Quero um desse pra mim...
Achei muito legal o texto.

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